CAPACIDADE DE CARGA NO
PLANEJAMENTO TURÍSTICO: ESTUDO DE CASO DA PRAIA BRAVA – ITAJAÍ FRENTE À
IMPLANTAÇÃO DO COMPLEXO TURÍSTICO
HABITACIONAL CANTO DA BRAVA
CARRYING
CAPACITY AND TOURISM PLANNING. CASE STUDY AT
Doris V. De M. Ruschmann[1]
Luciana Paolucci[2]
Nelson A. L. Maciel[3]
Palavras-chave: Turismo sustentável. Capacidade de carga. Indicadores.
Abstract: Sustainable tourism presumes cultural authenticity,
social inclusion, conservation of natural resources and service quality. Those
are major issues standing for economical viability in the long run. This
article analyzes carrying capacity in
Key-words: Sustainable tourism. Carrying
capacity. Indicators.
O
turismo é um fenômeno social e econômico com grandes dimensões. Historicamente,
a atividade turística tem se expandido a taxas mais crescentes do que a média
dos setores da economia. O crescimento observado nos últimos 22 anos mostra que
o número de chegadas de turistas mais que duplicou (2.49 vezes) e a receita
gerada foi mais que quadruplicada (4,6 vezes) em dólares correntes (RABHAY, 2004
apud PAOLUCCI, 2005).
O
mercado encontra-se cada vez mais segmentado, criando segmentos e nichos
específicos. O turismo contemporâneo é um grande "consumidor" da
natureza e sua evolução, nas últimas décadas, ocorreu como conseqüência da
"busca do verde" e da "fuga" dos tumultos dos grandes
conglomerados urbanos por pessoas que tentam recuperar o equilíbrio psicofísico
em contato com ambientes naturais durante o seu tempo de lazer. Segundo
Ruschmann e Rosa (2006), a cada ano podem-se notar as mudanças que ocorrem nos
destinos turísticos,seja na infra-estrutura básica, melhorando a vida dos
moradores locais, até a infra-estrutura turística, atendendo as necessidades
dos visitantes.
As
últimas décadas vêm testemunhando a consolidação da importância da
sustentabilidade
As
definições de sustentabilidade também falam freqüentemente
A
sustentabilidade de um meio turístico depende necessariamente do tipo de
turismo que ocorre na área e que poderá ser um instrumento de sustentação do
modelo de desenvolvimento ecológico, exigido pelas grandes transformações no
modo de vida em todo globo terrestre. O planejamento das ações de
desenvolvimento de empreendimentos turísticos em meios naturais é entendido,
atualmente, como essencial para o êxito das estratégias de competitividade, em
um mercado altamente dependente de meios naturais protegidos e de
empreendedores com visão sustentável dos meios nos quais atua. (RUSCHMANN; ROSA,
2006)
O
turismo sustentável considera a autenticidade cultural, a inclusão social, a
conservação do meio ambiente e a qualidade dos serviços, como peças fundamentais
para a viabilidade econômica do turismo ao longo prazo, no entanto, um
desenvolvimento inadequado da atividade, seja qual for o segmento considerado,
pode causar sérios impactos nos patrimônios natural e cultural. Segundo
Ruschmann (1997), os impactos do turismo referem-se à gama de modificações ou à
seqüência de eventos provocados pelo processo do desenvolvimento turístico nas
localidades receptoras. As variáveis que provocam os impactos têm natureza,
intensidade, direções e magnitudes diversas, porém, os resultados interagem e
são geralmente irreversíveis. No sentido de prevenir os impactos causados pela
atividade turística, é necessário elaborar um planejamento para o local. O
planejamento deve ser intersetorial e baseado na determinação da capacidade de
carga dos recursos naturais, visando a preservação dos ecossistemas e o
atendimento das expectativas dos vários segmentos do mercado turístico que
buscam o encontro com a natureza (RUSCHMANN, 1997).
Neste
sentido, este trabalho tem como objetivos avaliar a capacidade de suporte
físico da Praia Brava, considerando o conforto ambiental relativamente à
população de moradores e usuários da praia e a projeção decorrente da
futura instalação do empreendimento
Complexo Turístico /Habitacional Canto da Brava, Itajaí/SC. e estabelecer
sugestões e recomendações que contribuam com o monitoramento do processo de
visitação e consolidação do empreendimento, conforme estabelecido e pedido para
aprovação do Relatório e Estudo de Impacto Ambiental pela Secretaria do Meio
Ambiente do Estado de Santa Catarina - FATMA (2006)
Marco institucional
A
Praia Brava localiza-se no município de Itajaí, distante
A Zona
Administrativa da Praia Brava, também conhecida como bairro Praia Brava, está
localizada na porção norte/sudeste do Município de Itajaí, entre os
promontórios rochosos da ponta do Morcego e a ponta da Preguiça. A área total é
de 4,32 Km² e
O
principal acesso se dá através da Rua José Menescau do Monte, no bairro de
cabeçudas (Itajaí). As vias intermunicipais que acessam a região são: Rodovia
Oswaldo Reis (Itajaí) e Avenida do Estado (Balneário Camboriú). A Rodovia
federal que dá aceso é a BR 101. (FATMA, 2006)
O
Complexo Turístico/Habitacional Canto da Brava constitui-se em um empreendimento
imobiliário e turístico composto por unidades habitacionais unifamiliares e por
um complexo de hospedagem, esporte e lazer, numa área de
Referencial Teórico
O termo
capacidade de carga, ou capacidade de suporte, traduzido do inglês carrying capacity, tem sua origem nas
ciências agrárias, especificamente no manejo de pastagens (TAKAHASHI, 1998 apud
BALDERRAMAS, 2001). No turismo, foi definido por Wagar no trabalho The carrying Capacity of Wild lands for
Recreation, de 1964 (apud PIRES, 2005) como “o nível de uso que uma área
pode suportar sem afetar a sua qualidade”, e aplicado em trabalhos de manejo de
visitantes em parques e reservas naturais protegidas. A aplicação do conceito
teve seu interesse aumentado a partir da década de 1970, como uma técnica para
gestão do turismo em áreas sensíveis (PIRES, 2005), observando que nessa mesma
época iniciaram-se, de forma mais contundente, os estudos referentes aos
impactos causados pela atividade turística de massa nos ambientes naturais e
artificiais. Em 1974, Wagar faz algumas reconsiderações na sua definição, admitindo
que a experiência recreativa é antes de tudo psicológica. A capacidade de carga
passou assim a ser expressa como sendo “o nível de uso recreativo que uma dada
área pode suportar ao mesmo tempo em que proporciona uma qualidade de
experiência recreativa sustentável” (WAGAR, 1974 apud TAKAHASHI, 1997). Siles
(2003) observa que nessa definição estão implícitos, pelo menos, dois
componentes: (i) um referente à capacidade de carga biológica ou biofísica
(Kb); (ii) e outro referente à capacidade de carga social (Ks). Ainda de acordo
com Siles (2003) “o conceito de experiência recreativa satisfatória apresenta
uma grande limitação para sua aplicação, devido à capacidade de adaptação do
homem: a Ks é variável e maior do que a Kb, ou seja, para uma mesma área e um
mesmo tipo de impacto, diferentes usuários têm diferentes opiniões”.
A
partir da década de 1990, o conceito de capacidade de carga passa a agregar
contribuições dos estudos das áreas de Ciências Florestais, Engenharia
Ambiental e Ecologia (BALDERRAMAS, 2001), em particular componentes ecológicos,
sociais e culturais; aspectos psicossociais da experiência turística dos
visitantes; e manejo, controle e gestão de áreas protegidas (PIRES, 2005).
Estes componentes podem ser verificados na definição de Boo (1990), que
considera “capacidade de carga como sendo a quantidade máxima de visitantes que
uma área pode acomodar mantendo poucos impactos negativos sobre os recursos e ,
ao mesmo tempo, altos níveis de satisfação para os visitantes”; e também na
concepção de capacidade de carga do Serviço Nacional de Parques, dos EUA, de
1992: “o tipo e nível de uso que pode ser conciliado enquanto sustenta os
recursos desejados e as condições recreativas que integram os objetivos da
Unidade e os objetivos de manejo” (TAKAHASHI, 1998 apud PIRES, 2005).
Nos
últimos anos, de acordo com Wallace (1993 apud BALDERRAMAS, 2001, p. 22),
[...] o conceito de capacidade de carga evoluiu em
diversos países desenvolvidos, tornando-se uma medida mais sofisticada em
relação ao que realmente está ocorrendo nos recursos de um parque ou na
experiência do visitante. Sabemos que não há correlação direta entre o número
de visitantes e os impactos negativos que afetam o solo, a vegetação, a vida
selvagem ou as experiências das outras pessoas. O grau de impacto depende de
muitas variáveis que se somam à quantidade de visitação [...]. Se forem
atingidos limites inaceitáveis de impacto negativo, será mais razoável
monitorar o impacto e efetuar mudanças na administração dos visitantes.
A
maioria das metodologias hoje utilizadas na determinação da capacidade de carga
turística em ambientes naturais fazem uso em diferentes medidas de 4 esferas de
componentes:
a) componentes biofísicos:
são aqueles relacionados aos recursos naturais; b) componentes sócio-culturais:
levam em conta os impactos do turismo sobre a população local; c) componentes
psicológicos dos visitantes: relaciona-se ao número máximo de visitantes para
os quais uma área está apta a oferecer uma experiência turístico-recreativa
satisfatória num determinado período; d) componentes de manejo e gestão:
refere-se ao nível de visitação que pode ser controlado numa determinada área,
e está relacionado com a disponibilidade de infra-estrutura e de recursos
humanos para a gestão da área em questão
Pode-se,
no entanto, fazer uma distinção entre dois tipos de metodologia, que, embora
sejam consideradas genericamente estudos de capacidade de carga, utilizam
abordagens bastante diferentes:
1) Métodos de capacidade
de carga e padrão numérico: procuram definir em termos quantitativos padrões de
densidade e de ocupação dos espaços turísticos, chegando a um resultado
numérico, como por exemplo o número máximo de visitantes em um local em um
determinado período. Nesta categoria incluem-se: o método de Cifuentes (CIFUENTES,1999)
desenvolvido para a Fundação Neotrópica da Costa Rica, e que estabelece três
níveis sucessivos – capacidade de carga física, capacidade de carga real e
capacidade de carga efetiva – para determinar a capacidade de carga. A partir
da avaliação da área disponível e do espaço ocupado por cada visitante
(capacidade de carga física), aplica-se índices de correção que quantificam
fatores relativos a fragilidades ambientais (capacidade de carga real) e
disponibilidade de recursos operacionais e infra-estrutura (capacidade de carga
efetiva). Cada um dos níveis representa uma capacidade corrigida em relação à
anterior, por isso a CCF será sempre maior do que a CCR, que por sua vez poderá
ser maior ou igual á CCE (SILES, 2003).
2) Modelos de gestão do
uso público em áreas naturais protegidas: as metodologias inclusas nesta
categoria procuram superar as limitações dos métodos tradicionais de capacidade
de carga, determinando, ao invés de um número de visitantes por período, níveis
de impacto desejáveis e critérios de manejo para condições flexíveis e
flutuantes de visitação. Dá-se, portanto, ênfase a critérios e ferramentas de
manejo, e também ao monitoramento contínuo dos impactos.
Na
prática, o que se verifica é que, por mais abrangente e minucioso que seja um
estudo de determinação de capacidade de carga ou de suporte, a determinação
precisa do número de visitantes ou usuários que um determinado local comporta a
priori é sempre discutível, seja em função da diversidade das variáveis
envolvidas, seja em função da complexidade da dinâmica dos processos sociais e
naturais, ou ainda em função do grau de subjetividade da percepção do usuário
em relação à qualidade da sua experiência.
Por
outro lado, a dificuldade em determinar o nível de visitação adequado para cada
local não invalida este tipo de trabalho, fundamental tanto no planejamento das
atividades turísticas e de recreação como na avaliação de propostas de
utilização de espaços naturais e no monitoramento dos seus impactos.
Neste
contexto, os estudos de capacidade de carga devem servir, sobretudo à definição
de um nível de visitação inicial desejável – em geral com uma margem de
segurança considerável – e à definição de parâmetros e indicadores para o
monitoramento do processo, que deve prever ajustes periódicos em função dos
impactos verificados.
Metodologia
O caso
da Praia Brava não foge a este padrão. Sobretudo em função dos fatores
históricos, sociais e culturais envolvidos, a determinação precisa da
capacidade de carga do local é bastante complexa. Para se determinar de forma
quantitativa a capacidade de carga do local, foi utilizado o método de
Cifuentes. Deve-se sempre ter em conta que o local já sofre diversos tipos de
impacto decorrentes da utilização para o turismo e para o lazer, tais como
pisoteio da vegetação de restinga, compactação do solo pela circulação de
veículos motorizados e lixo não coletado, entre outros, e que o ordenamento
destas atividades por meio de empreendimentos que atendam a padrões adequados
de sustentabilidade é desejável, pois os impactos negativos tendem a diminuir.
Para se
determinar de forma quantitativa a capacidade de carga do local, foi utilizado
o método de Cifuentes, que permite a integração e a quantificação de fatores
físicos, bióticos e de infra-estrutura. Os resultados quantitativos foram ainda
ponderados por uma análise dos impactos e dos limites de mudança aceitáveis do
ponto de vista da percepção do usuário.
O
trabalho foi desenvolvido de acordo com as seguintes etapas:
a) Coleta de dados:
Os
dados utilizados na realização do trabalho foram obtidos a partir das seguintes
fontes: Revisão bibliográfica sobre o tema e o local, incluindo a revisão de documentos técnicos sobre o
projeto e o local: Plano Diretor do Município, Plano de Gerenciamento Costeiro,
Plano de Ordenamento da Orla da Praia Brava, etc. e verificação in loco de
fatores físicos, bióticos e de infra-estrutura
b) Definição de parâmetros
de uso
Nesta
etapa buscou-se, a partir de pesquisa bibliográfica sobre dados padronizados de
densidades recomendadas para praias, identificar parâmetros visando fundamentar
a decisão com relação ao nível de uso mais adequado do ponto de vista ambiental
e também da percepção do usuário. O nível de uso é expresso pela densidade (m² /
banhista), e reflete o tipo de turismo e recreação que se pretende incentivar
no local.
c) Determinação da
capacidade de carga
O
cálculo da capacidade de carga baseou-se no método de Cifuentes, que prevê a
determinação dos níveis de capacidade de carga física, capacidade de carga real
e capacidade de carga efetiva.
No
cálculo de capacidade de carga física, a fórmula utilizada é a seguinte:
CCF= S x T
s.v.
t.v.
onde:
S:
área total de visitação
s.v:
área ocupada por um visitante
T:
tempo total em que a área está aberta
t.v:
tempo necessário para visitar o local
No
cálculo da capacidade de carga real – que incorpora restrições decorrentes de
fatores físicos e bióticos – a fórmula utilizada é a seguinte:
CCR= CCF x 100-FL1 x 100-FLn
100 100
onde:
CCF:
capacidade de carga física
FL:
fatores físicos e bióticos de redução
No
cálculo da capacidade de carga efetiva – que incorpora restrições decorrentes
de fatores de infra-estrutura e gestão, a fórmula utilizada é a seguinte:
CCE= CCR x 100-FC1 x 100-FCn
100
100
onde:
CCR:
capacidade de carga real
FC:
fatores de infra-estrutura, gestão, do entorno, etc
Os
coeficientes de restrição decorrentes de fatores físicos, bióticos, de infra-estrutura
e gestão são apresentados mais adiante, na descrição dos resultados da
aplicação da metodologia.
d) Definição de indicadores para monitoramento:
No que se refere à seleção de indicadores para o
monitoramento dos impactos, foi dado ênfase a indicadores físicos, bióticos e
sociais de fácil verificação e que reflitam a sensibilidade da área para a
visitação. Alguns dos indicadores comumente usados são: compactação do solo,
erosão visível, densidade, diversidade e extensão da cobertura vegetal,
alterações na presença de fauna nativa, sucesso reprodutivo de espécies
animais, percepção do visitante em relação aos impactos ambientais, satisfação
do visitante, entre outros os indicadores selecionados para cada uma destas
zonas é apresentado mais adiante.
e) Recomendações e
conclusões
A etapa
final do trabalho compreendeu a análise ponderada dos resultados quantitativos
em função da percepção do usuário, a definição de diretrizes de gestão e
planejamento, e a identificação de áreas prioritárias para o aprofundamento de
estudos no local.
Resultados
Capacidade de carga física
Para
determinar a capacidade de carga física utilizando o método de Cifuentes, é
preciso estabelecer valores para as variáveis levadas em conta no cálculo:
- área total de visitação;
- área ocupada por um
visitante;
- tempo total em que a
área está aberta; e
- tempo necessário para
visitar o local.
A área
total de visitação é facilmente determinada a partir da cartografia,
levantamentos in loco e dos dados
secundários de estudos já realizados no local.
O fator tempo – tanto o tempo total de abertura da área como o tempo
necessário para visitar o local – não foi considerado neste estudo, por não se
adequar às atividades de recreação de praias e ao tipo de utilização de
recursos costeiros. Em geral, estes fatores são válidos sobretudo para
aplicação em trilhas e outros atrativos que pressupõe um roteiro determinado de
visitação, vários grupos de visitantes em períodos de tempo sucessivos, e
ingresso controlado. No caso de praias, o que se verifica em geral é um tempo
muito maior de permanência, baixa rotatividade e falta de controle de ingresso,
o que não justifica a aplicação do fator tempo. A não aplicação deste fator
significa assim uma capacidade de carga menor, equivalente a apenas um turno de
visitação, e reflete ao número de usuários máximo que o local pode receber em
um dado momento (e não em um período de tempo).
O fator
relativo à área ocupada por um visitante é crítico para a determinação da
capacidade de carga, já que reflete o nível de uso considerado mais adequado
para os recursos em questão, e um julgamento subjetivo da qualidade da
experiência do usuário da praia.
Definição de parâmetros de uso
Existem
vários estudos que procuram determinar o nível de uso mais adequado de praias
do ponto de vista do conforto e da qualidade da experiência do usuário.
O Instituto
Brasileiro de Turismo - EMBRATUR aplicou
na década de 70 o projeto Turis, que teve, entre outros objetivos, estabelecer
parâmetros sobre a densificação de utilização de praias. De acordo com o
projeto, adotou-se o estudo de três densidades de ocupação para cada uma das
categorias vocacionais:
CATEGORIA
A – acima de 15 m²/ banhista . Pouco densa, geralmente utilizada para
locais que deverão receber equipamentos de alta categoria. Trata-se de praias
comumente de porte pequeno e beleza intensa.
CATEGORIA
B – de
CATEGORIA
C – até 5 m²/ banhista. São praias destinadas à ocupação
Bound-Bovy
e Lawson (1977 apud UNIVALI, 1997) recomendam
Pereira
da Silva (2002), em estudo que visa subsidiar a determinação da capacidade de
carga em praias do litoral atlântico português, define 4 categorias de
densidade em praias:
−7 a
−10 a
15 m²: densidade elevada, característica de praias próximas a
centros urbanos, com fácil acesso.
−15 a
20 m²: densidade moderada, característica de praias a maior distância de
centros urbanos, com pouca infra-estrutura
−20 a
30 m²: densidade reduzida, típica de praias isoladas, sem nenhuma infra-estrutura
de visitação.
Os
estudos específicos sobre a Praia Brava apresentados no projeto de Restauração
Ambiental e Ordenamento da Orla da Praia Brava trazem como referência a
densidade da praia central de Balneário Camboriú, que nos momentos de maior
intensidade (entre 9:00 e 12:00, nos meses de verão) apresentam densidade de
No
presente estudo, a determinação inicial da densidade ideal de uso da Praia
Brava parte da contraposição de dois fatores principais: a paisagem natural
relativamente preservada da Praia Brava, e altamente valorizada por seus
usuários, que afeta consideravelmente a qualidade da sua experiência; e a
proximidade e facilidade de acesso a partir de Balneário Camboriú e Itajaí, e a
crescente pressão pela utilização do local.
A
contraposição destes fatores sugere que seja adotada um valor médio para a
densidade de utilização da Praia Brava, de maneira a atender a demanda
crescente pelo atrativo sem comprometer suas características fundamentais.
Adotou-se assim
Na
definição da capacidade de carga física da área da Praia Brava foram utilizados
os seguintes dados:
- área total do setor:
- densidade de ocupação:
De acordo com a fórmula
simplificada (sem considerar o fator tempo) para o cálculo da capacidade de
carga física, CCF= S tem-se:
s.v.
CCF=
Assim, a capacidade de
carga física da área da Praia Brava como um todo é de 8.993 usuários.
Capacidade de Carga Real / Fatores Bióticos de
Redução
Para r
a estimativa do fator de redução biológico da capacidade de carga física da
Praia Brava menos subjetiva, tentou-se estipular e/ou atribuir valores para
cada um dos fatores bióticos, no sentido de se restringir ou incrementar a
capacidade de carga em função do tipo de uso e ocupação que se verifica
atualmente e que se pretende futuramente. Para se estipular e/ou atribuir esses
valores de forma prática e objetiva, seriam necessários vários tipos de
informações sobre os mais variados aspectos da biologia das espécies animais e
vegetais presentes na Praia Brava. Uma vez que, não se dispõem de todos os
dados referentes aos fatores bióticos, optou-se pela criação e elaboração de um
modelo baseado no estado de conhecimento atual da biota local.
Procedeu-se
então ao preenchimento de tabelas para posterior aplicação do método
estatístico. Aos descritores bióticos considerados para cada ecossistema, estado
de conservação (% de área preservada), forma de utilização da área pela fauna
(alimentação, crescimento, reprodução, repouso, abrigo), estágios sucessionais
da vegetação (primária, pioneiro, inicial, médio e avançado), área de uso
antrópico (% de área total), presença de espécies raras ou comuns, e presença
de espécies típicas de ambientes alterados ou preservados, foram atribuídos
valores que variaram de
A
partir da atribuição desses valores foi possível estimar seu valor médio e a
sua variância, utilizando a expressão aproximada para a distribuição de
probabilidade Gama, caracterizada pelas fórmulas:
Média = (Cai + 3Cpi +
Cbi)/5 e
Variância = (Cbi – Cai)/25
Onde:
Cai é o valor mínimo; Cpi é o valor mais provável; e Cbi é o valor máximo
observado atualmente (no caso dos cálculos para a situação atual), ou o máximo
esperado (no caso dos cálculos para a situação posterior à implantação do
“Complexo Turístico/Habitacional do Canto da Brava”).
Definiu-se
então duas situações para essa avaliação, uma situação atual, ou seja, antes da
implantação do “Complexo Turístico/Habitacional do Canto da Brava”, e outra
posterior à implantação do empreendimento.
Os
resultados obtidos, ou seja, a variância estimada para cada descritor, foi
então somada e, através da média aritmética da somatória dessas variâncias,
obteve-se para cada ecossistema um fator de redução. Posteriormente,
realizou-se a somatória dos fatores de redução de todos os ecossistemas
considerados, extraindo-se assim, um fator de redução total para cada situação
(anterior e posterior à implantação do “Complexo Turístico/Habitacional do
Canto da Brava”). Novamente foi calculado um valor médio, chegando-se a um
valor único para o fator de redução biótico, que pudesse ser utilizado num
contexto mais global para toda a Praia Brava.
Dessa
forma, analisando-se os fatores de redução biótico pode-se constatar que o
valor obtido para o fator de redução biótico da capacidade de carga física da
Praia Brava, antes da implantação do “Complexo Turístico/Habitacional do Canto
da Brava” foi de 0,55 ou 55% da capacidade de carga física. Já o valor obtido
para o fator de redução biótico da capacidade de carga física da Praia Brava,
após a implantação do “Complexo Turístico/Habitacional do Canto da Brava” foi
de 0,39 ou 39% da capacidade de carga física.
Finalmente,
pode-se concluir que o valor médio mais provável para o fator de redução
biológico da capacidade de carga física da Praia Brava, antes ou depois da
implantação do “Complexo Turístico/Habitacional do Canto da Brava” pode ser de
0,47 ou 47% da capacidade de carga física. Com base neste fator, e utilizando a
fórmula abaixo o cálculo da capacidade de carga real, temos os seguintes
resultados:
CCR= CCF
x 100-FL1
100
Capacidade
de carga real para a Praia Brava:
CCR=
8.993 x (100 – 47)/100 = 4.766 usuários
Capacidade de Carga Efetiva
A
análise da capacidade de carga efetiva, aplica-se sobre a capacidade de carga
efetiva um fator de redução derivado de restrições decorrentes de limitações na
infra-estrutura de recepção e da capacidade de gestão do número de usuários
previsto. Tipicamente, são considerados fatores de restrição a ausência ou
insuficiência de instalações sanitárias, falta de coleta de lixo, falta de
sinalização interpretativa e programas de educação ambiental adequados,
equipamentos de alimentação e hospedagem, entre outros. A aplicação direta
destes critérios no estudo em questão não é possível, pois o empreendimento
analisado e o destino Praia Brava como um todo – ainda se encontram em fase de
pré-operação, ou em estágio inicial de desenvolvimento. Em outras palavras, a
aplicação direta de fatores de correção referentes a infra-estrutura e gestão
neste momento faria com que a capacidade de carga efetiva do local tendesse a
zero, o que nem é razoável nem útil do ponto de vista do planejamento da sua
ocupação.
Neste
contexto, a abordagem mais razoável parece ser a de uma análise das condições
pré-existentes para a implantação de infra-estrutura de suporte à utilização do
local para o turismo e o lazer, e a determinação do nível de uso adequado a
estas pré-condições, partindo-se do pressuposto de que a instalação da infra-estrutura
se dará de acordo com padrões de qualidade adequados.
Foram
selecionados 4 fatores críticos para determinar possíveis restrições à utilização do local do ponto de vista da infra-estrutura
e da gestão:
a) disponibilidade de água
para abastecimento
b) disponibilidade de coleta e tratamento de esgoto
c) disponibilidade de serviços de coleta de lixo
d) disponibilidade de áreas para estacionamento
A partir
da análise dos fatores selecionados, verificou-se que, no caso da Praia Brava,
a capacidade de carga efetiva favorece um aumento da capacidade de carga real
do local. A quantificação deste aumento, no entanto, é bastante subjetiva,
devido à falta de parâmetros claros de avaliação, sobretudo em função do
empreendimento encontrar-se em fase pré-operacional, e do local como um todo
encontrar-se em estágio inicial de desenvolvimento.
Sendo
assim, a abordagem proposta é a de considerar o efeito da capacidade de carga
efetivo nulo, igualando o coeficiente a 1. Ainda que esta abordagem não
reflita os ganhos em função do ordenamento da ocupação do local, ela é
pertinente do ponto de vista do princípio de precaução, que prevê o
estabelecimento de um padrão inicial conservador, que pode ser aumentado
gradativamente em função dos resultados do monitoramento do processo.
Tem-se portanto a
Capacidade de carga Efetiva da Praia Brava:
CCE = CCR = 4.766 usuários
Indicadores para monitoramento
Os
números referentes à capacidade de carga apresentados anteriormente, são
considerados iniciais, servindo como base para o planejamento da ocupação do
local, desde que seja previsto um monitoramento contínuo dos efeitos do uso do
local para o turismo e lazer. Neste item são apresentados indicadores que
permitirão acompanhar a evolução dos impactos no local, e a tomada de decisões quanto
a eventuais mudanças no seu manejo.
Foram
selecionados indicadores biológicos e de infra-estrutura e gestão facilmente
monitoráveis, e que permitem uma verificação objetiva das condições ambientais
do local.
Os
indicadores sugeridos para infra-estrutura e gestão são os seguintes:
- abastecimento de água:
evolução percentual do atendimento ao consumo
- tratamento de esgoto: evolução
do índice de coliformes fecais e DBO em corpos d’água, Índice de Poluição das
Praias – IPP (no caso de esgoto não se aplica a evolução percentual de
atendimento pois a coleta e tratamento do esgoto não deve se dar por órgão
público no local)
- coleta de lixo:
verificação visual de presença de lixo
- impacto de áreas de
estacionamento: pisoteio e redução da vegetação de restinga arbustiva,
descaracterização de áreas de dunas (em conjunto com indicadores biológicos).
Conclusões e recomendações
Embora a
definição da capacidade de carga para a Praia Brava apresentada neste estudo
tenha sido feita com base em critérios objetivos e utilizando da melhor maneira
possível os dados disponíveis, é importante destacar que a identificação,
quantificação e qualificação dos diversos aspectos envolvidos na avaliação dos
impactos antrópicos na biota da Praia Brava requerem estudos mais aprofundados.
Por
outro lado, é inegável a importância do estudo e da quantificação inicial da
capacidade de carga para subsidiar a tomada de decisões relativa ao
planejamento da ocupação da área, e a avaliação de projetos da iniciativa
privada.
Em que
pese a necessidade de pesquisas mais aprofundados e o monitoramento ambiental
contínuo do local, este estudo demonstrou que a futura implantação de um
empreendimento turístico não apenas é compatível com o padrão de uso desejável
para a Praia Brava, como também contribui com sua conservação, à medida em que
favorece o ordenamento da sua ocupação.
A
manutenção da diversidade biológica original da Praia Brava dependerá de um
manejo efetivo que envolva a redução do impacto humano, não necessariamente
reduzindo o número de moradores e visitantes a um máximo suportável pela
resiliência dos ecossistemas, mas implementando uma nova postura frente a essa
visitação e/ou ocupação por parte da população usuária da Praia Brava.
Cabe por
fim ressaltar, ainda com relação à quantificação da capacidade de carga, que se
optou neste estudo por adotar números conservadores tanto na capacidade de
carga física como na capacidade de carga real, de maneira a garantir uma margem
de segurança na definição de políticas públicas e na avaliação do
empreendimento. Com relação a este último, é importante ainda ressaltar que a
capacidade de carga apresentada não leva em conta o fator tempo, partindo do
pressuposto que todos os usuários do complexo turístico e habitacional estarão
no local ao mesmo tempo. Com a rotatividade natural que deverá ocorrer no uso
das instalações do empreendimento, o impacto real tende a ser menor do que o
estimado.
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Artigo
recebido em março de 2008.
Aprovado
para publicação em maio de 2008.
[1] Programa de Pós-graduação Stricto
Sensu em Administração e Turismo, UNIVALI – d.ruschmann@univali.br
[2]Programa de Pós-graduação Stricto
Sensu em Administração e Turismo, UNIVALI – lpaolucci@hotmail.com
[3] Faculdade de Ciências da Saúde de São Paulo Instituto Brasileiro de Estudos – leleuou@uol.com.br